Por Antonio Pinho
O STF está na
origem de uma série de problemas. Suas decisões sobre pautas polêmicas causam,
inevitavelmente, desconforto entre a população. Em suas votações o placar tende
a ser apertado. Isso por si só é uma grande evidência do caráter subjetivo e
ideológico de suas decisões. Sempre me pergunto a cada novo desastre criado
pelo STF: e se os votos vencidos estavam defendendo a tese correta? Se fosse algo
técnico, objetivo, não existiria tanta divergência.
A soltura de
José Dirceu pelo STF gerou indignação geral, e alimentou as suspeitas do povo,
com toda razão, que algo muito errado deve ocorrer nos bastidores de nossa
Suprema Corte. O impeachment de Dilma e a Lava Jato mostraram que o executivo e
o legislativo estavam – e continuam estando – imersos num mar de lama. Cabe indagar:
um pouco dessa lama também não teria respingado no STF? Em meio a tanta
sujeira, o judiciário seria o único dos três poderes ainda imaculado?
O tratamento
que o STF deu a José Dirceu revoltou a todos, mas muito mais grave para a
economia nacional é o que se fez com o Funrural, e sobre isto pouco se fala. O
Funrural é um imposto que taxa em 2,3% a receita bruta do agronegócio. É um
montante anual de mais de R$11 bilhões que o governo retira do setor mais
dinâmico da economia nacional, e serve basicamente para tapar o rombo da
previdência e para financiar os sindicatos. Ocorre que os produtores rurais,
como em qualquer outro setor, já contribuem para o INSS sobre o salário base. O
Funrural é, portanto, um imposto inconstitucional, pois se taxa o produtor duas
vezes com uma mesma finalidade, que é financiar a Previdência Social.
Em 2010 o STF
reconheceu a inconstitucionalidade do Funrural. Entretanto, no final de março
deste ano essa decisão foi revertida pelo mesmo STF, e o imposto voltou a
existir. O STF contradisse a si mesmo. Afinal, qual é a decisão correta, a de
2010 ou a de agora?
Diante de tal
insegurança jurídica, os produtores rurais e a Frente Parlamentar da
Agropecuária (FPA) se uniram num movimento para reverter os prejuízos
econômicos provocados pela decisão do STF. A causa pelo fim do Funrural uniu o
agro entorno do movimento “Funrural não” que, no dia 1º de maio, levou 2 mil
produtores rurais à Brasília. Eles se reuniram num acampamento cujo intuito era
pressionar o Congresso para que este apresentasse uma solução ao problema. O
auge do movimento ocorreu no dia 3, quando ocorreu uma audiência pública no
Congresso para a discussão de propostas sobre o Funrural.
Foram
debatidas várias alternativas ao Funrural. Há, contudo, uma importante questão
jurídica que foi levantada por parlamentares da FPA. O governo não pode renunciar
receita, ou seja, teoricamente afirma-se que não seria possível um perdão de
100% da dívida criada com a constitucionalidade do Funrural. Mas o próprio
governo chegou a cogitar um abatimento de 90% da dívida.
Dessa forma,
uma das propostas da FPA é abater o montante devido à Receita Federal pelos
produtores que deixaram de recolher o tributo por terem liminares. Uma idéia
seria diminuir o percentual cobrado, do atual 2,3% sobre faturamento bruto para
1%, ou ainda a cobrança de um certo percentual sobre o salário base. O produtor
escolheria a opção de pagamento mais conveniente para o seu caso. Esta proposta
foi defendida pelo deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS), membro da FPA.
Já Nilson
Leitão (PSDB-MT), presidente da FPA, falou em se cobrar no máximo 1% sobre a
folha de pagamento, ou 0,25% sobre o faturamento bruto. “O produtor não se nega
a pagar a Previdência. Agora, não dá para continuar com esse modelo do
Funrural. Ele é caro. Ele é confuso. O que precisa é pensar na modernização
dessa cobrança de forma eficiente e vantajosa para o produtor”, afirmou Nilson
Leitão ao site Notícias Agrícolas. O deputado ainda defendeu a
necessidade de uma reforma previdenciária para o agro.
Como
resultado da pressão gerada pela mobilização do movimento “Funrural não”, o
senador Ronaldo Caiado protocolou um projeto de lei no senado para o perdão da
dívida daqueles produtores que deixaram de recolher o tributo. Há também uma
proposta da senadora Kátia Abreu para a mudança na lei que atualmente
regulamenta o Funrural. Como informa o site Notícias Agrícolas, a proposta da senadora “tira do
ordenamento jurídico os incisos I e II do art. 25 da Lei 8212/91 e encontra-se
na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), com possibilidade de
votação ainda no mês de maio”.
Por
orientação do presidente Temer, a FPA deverá se reunir com a Receita Federal,
na próximo semana, para a discussão das alternativas. Os deputados da Frente
Parlamentar defenderão a redução do percentual cobrado. O deputado Nilson
Leitão afirmou que o governo defende a substituição do Funrural por um novo
sistema com o qual o agronegócio possa contribuir de forma mais moderna para a
Previdência Social. O imposto, portanto, não deixaria de existir, seria apenas
substituído por outro tributo, o que não implica numa profunda redução da carga
tributária, algo que é urgentemente necessário para que a economia brasileira
cresça e se torne mais dinâmica.
O ex-secretário
da Receita Federal, Everardo Maciel disse que não há como o governo renunciar a
receita. “Dispensar receita é uma idéia
inimaginável dentro do Governo, pois há imperiosa necessidade de arrecadação”.
Ele ainda declarou que a Receita Federal deverá imediatamente iniciar a
cobrança do tributo,"se já não estiver cobrando". De fato, em
entrevista à TV Terra Viva, o advogado Jeferson Rocha, da Andaterra, informou que há relatos de que
alguns produtores já estão sendo executados pela Receita Federal.
Ao final do
acampamento, Jeferson Rocha apontou os novos rumos que a movimentação contra o
imposto deve tomar: “Há algumas propostas por parte de produtores. É uma medida
um pouco além de uma simples manifestação. Fala-se, entre produtores do sul,
por exemplo, em reduzir a área de plantio. 10% num primeiro momento. Se não for
atendido, 20%, e por aí vai”. Pensa-se, assim, em medidas mais fortes de
pressão política para a mudança do atual quadro.
O crescimento
do agro depende de uma política voltada para a diminuição da atual carga
tributária, que atualmente drena 41% de toda riqueza nacional. As mudanças
dependem, portanto, da intensa mobilização dos produtores rurais. A pressão
deve continuar, pois o certo é o fim desse imposto. Contudo, os deputados, o
executivo e a Receita Federal não querem, de fato, o fim do Funrural. O Supremo,
com uma postura mais ideológica do que jurídica, também não quer o fim do
imposto. Muitos indícios, inclusive, levam a crer que o resultado do julgamento
atendeu a um pedido do próprio governo para que pudesse fechar as contas.
Portanto, se
os produtores rurais esperarem pelos três poderes nada mudará substancialmente.
O que ocorrerá é a substituição do Funrural por outro imposto, o que apenas
seria mais do mesmo. A meta do agronegócio deve ser intensificar a pressão
política por meio de manifestações pacíficas. A grande questão não é apenas o
Funrural, mas a defesa de uma drástica queda nos impostos e na burocracia para
a criação de um ambiente economicamente mais livre.
***
Produtor rural, associe-se à Andaterra - Associação Nacional de Defesa dos Agricultores, Pecuaristas e Produtores da Terra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário