sábado, 22 de abril de 2017

Bebês são racistas? Ou: quando a ciência serve a militância.

Thiago Kistenmacher

Não é raro ver a ciência se submetendo à militância política. Logo os climatologistas dirão que o frio é uma construção social para oprimir pessoas que não têm agasalhos; biólogos talvez digam que a heterossexualidade é uma invenção do capitalismo e pediatras falem que bebês já são racistas... Mas, um momento. Parece que esta última já existe. Isso mesmo. O Yahoo Notícias publicou uma breve matéria intitulada Bebês já são racistas antes dos nove meses de idade, descobre estudo.” (https://uk.news.yahoo.com/babies-already-racist-nine-months-old-study-finds-142817710.html)

A matéria inicia indicando: “Costumamos acreditar que as crianças são seres totalmente inocentes – mas parece que as sementes do preconceito são plantadas muito cedo. O que não parece nada inocente aqui é a matéria e o “estudo”. O site também informa que “As descobertas sugerem que, mesmo de seis a oito meses de idade, os bebês já são inclinados a aprender com membros da sua própria raça”. Ou seja, se as “sementes do preconceito são plantadas muito cedo”, logo, estão sugerindo que os pais são racistas e ensinam as crianças a seguirem o mesmo caminho.

Existe um ponto interessante que dá margem a uma dupla interpretação: os autores da matéria deveriam ser mais específicos e dizer se o bebê já nasce “preconceituoso” ou se este preconceito é “plantado”, como citado acima. Ademais, se o único intuito da notícia fosse demonstrar a proximidade dos bebês com sua própria etnia, e não acusá-los de “preconceituosos” com o propósito de incitar polêmica, não questionariam sua inocência.

O que acontece, provavelmente, é a identificação que o bebê tem com seus parentes mais próximos. Se ele é branco, teve os pais brancos e, por isso, se identifica mais com os brancos. Ocorre o mesmo com os negros, não? Mas a sede de polêmica do Yahoo - que ilustrou a matéria com a foto de um bebê branco, claro - traz um texto breve e sem os pormenores que possivelmente anulariam essa conversa de duplo sentido.

Em outro trecho a notícia informa que “Dois estudos feitos na Universidade de Toronto mostram que crianças de seis a nove meses de idade já podem exibir sinais de preconceito racial.[Atenção para o destaque em negrito e sublinhado dado ao “preconceito racial” pelo Yahoo]. Será que é preciso utilizar o termo “preconceito racial” para dizer que uma criança branca se identifica mais com brancos e uma criança negra se identifica mais com negros? Teria o estudo outro objetivo que não somente o de estudar o comportamento infantil? Possível. É mais do que óbvio que para se obter uma conclusão tão rasa e fazer uma matéria tão forçada, a biologia e a antropologia são ignoradas a fim de alimentar a polêmica em torno da questão racial. Outro fator que prova essa intenção, de fomentar a discussão, é o fato de a matéria já ter circulado anos atrás e, de repente, ter sido replicada sem qualquer razão aparente.

Diz a notícia que um teste descobriu que “a probabilidade de um bebê ‘seguir com o olhar’ alguém que não fosse de sua própria raça era bem reduzida.” Não duvido que se fosse ao contrário, isto é, se fosse mais provável que o bebê seguisse com os olhos pessoas de “outra raça”, os especialistas diriam que ele o faz porque considera as outras etnias como exóticas e estranhas, por isso o interesse. O resultado seria o mesmo: o bebê é “preconceituoso” porque estranha pessoas de outra cor. Ou será que o bebê já nasce com o “pecado original” do racismo? É cada coisa...

O Yahoo ainda assinala que o Dr. Kang, professor no OISE’s Jackman Institute of Child Study, principal autor dos estudos, acentuou que “As conclusões destes estudos são significativas por muitos motivos”, mas não enuncia quais são. Por quê? Constatada a lacuna, fica a pergunta: será que o estudo não teve o resultado esperado ou será que o resultado obtido não foi aquele que o Yahoo gostaria que fosse? Quem sabe se a matéria fosse publicada na íntegra e sem omissões, descobríssemos que os bebês simplesmente se identificam com seus grupos mais próximos. Mas a manobra do Yahoo faz parecer que todo bebê é um capitão do mato em potencial.

Enfim, se por um lado o objetivo da matéria foi causar qualquer polêmica, por outro deveria levar em consideração que, se os “bebês já são racistas antes dos noves meses de idade”, o racismo não pode ser atribuído assim tão simplesmente ao “capitalismo”, como a “galerinha do bem” vive repetindo.

Não restam dúvidas que as meias palavras da matéria discutida servem mais à confusão interpretativa e, por isso, à militância pela questão racial, do que à ciência. Seria mais produtivo se, em vez de procurar pêlo em ovo, os especialistas procurassem solucionar problemas, não multiplicá-los.




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